De união em união, aos 55 anos, ela celebra o melhor da vida
Se há 27 anos, quando abraçou a carreira de advogada, alguém dissesse a Marilucia Duarte que um dia se tornaria celebrante de casamentos, ela certamente não acreditaria. Como também duvidaria de quem aventasse essa possibilidade, durante as mais de duas décadas em que atuou nas varas de Família e de Responsabilidade Civil. Mas hoje, aos 55 anos, ela não tem dúvidas: celebrar uniões – a atividade que descobriu, meio por acaso, quando há um ano aceitou celebrar o casamento de uma sobrinha – virou sua profissão de fé. E isso não foi só uma feliz coincidência.
“Eu sempre soube que a minha atuação no Direito tinha data marcada para terminar, por conta da grande sobrecarga emocional que as áreas em que me especializei geram”, conta ela. “Porém, nunca pensei que atuaria como celebrante de uniões. Quando pensava na aposentadoria, cogitava dar aulas, já que gosto de trocar experiências e tenho facilidade de comunicação”.
“Como advogada, passei 27 anos tentando resolver problemas das mais diversas naturezas. Por conta disso, administrei uma carga de emoções muito pesada”.
Quando, no caminho para os 50 anos, tive um AVC, vi que precisava buscar algo mais leve; algo que colocasse minha emoção a serviço das pessoas, mas sem me custar a saúde, a vida.
“Ali, percebi que a vida é realmente curta; não dá pra desperdiçar, né?” – reflete ela, ao mesmo tempo em que assevera que a prática de celebrante de uniões tem lhe dado essa possibilidade: trabalhar feliz, sem stress, podendo rir alto, porque não há mais conduta protocolar a seguir.
E Marilucia vai mais além, ao reconhecer que, mesmo tendo sido por acaso que a atividade de celebrante de uniões entrou em sua vida, não foi coincidência a mudança ter acontecido depois dos 50 anos – momento em que ela começou a se questionar “a sério” sobre o que fazer depois da aposentadoria.
“Sentia que a hora estava chegando e que, ligada nos 220 wolts como sou, não conseguiria ter uma rotina só de avó” – afirma ela, ao mesmo tempo em que enfatiza ser muito grata por tudo o que o exercício do Direito lhe proporcionou.
“Foi a profissão que me ensinou a ter jogo de cintura, a lidar com as minhas próprias emoções e que me possibilitou criar meus três filhos. Sem ela não estaria aqui hoje” – conclui.
A sobrinha, Mariana Fernandes, que a convidou para sua primeira celebração, em seu depoimento na página ‘Celebrando Uniões’, que Marilucia mantém no Facebook, compartilha sua espécie de premonição em relação à mudança de carreira da tia:
“Nunca quis me casar em uma cerimônia, pois sempre achei que preferiria investir em uma viagem de lua-de-mel. Festa, pra mim, não fazia muito sentido. Até que um dia percebi o quanto é raro encontrar alguém com quem se queira passar o resto da vida. Decidi que era algo a ser celebrado e compartilhado com pessoas queridas. Daí, veio outra questão: era tudo tão caro, que questionei se valeria mesmo a pena. Marilucia então me disse algo de que nunca esquecerei: ‘fique feliz por estar usando esse dinheiro em uma celebração do amor e não em um hospital’. A partir desse momento, fiquei sabendo: só ela poderia celebrar meu casamento. E assim, antes mesmo de ter um vestido ou um local para casar, já a tinha escolhido como celebrante”.
E assim foi. Dia e hora marcados, lá estava Marilucia no altar, ao lado de padrinhos e noivo, à espera da chegada da noiva. Ela, celebrante pela primeira vez, e todos os frios na barriga inerentes a qualquer debutante, não importa a idade. Conta que se tranquilizava, lembrando a si mesmo, que havia, cuidadosamente, preparado um roteiro de celebração, baseado em tudo o que conhecia – e descobriu no processo de preparação – sobre a história da sobrinha e do futuro marido. Enquanto repetia de si para si: “tudo vai dar certo”, se assegurava que estava pronta para seguir o script, na forma que o havia ensaiado, tantas e tantas vezes, semanas antes.
Porém, a emoção de ver as avós materna e paterna de Mariana abrirem o cortejo, como damas-de-honra, reverteu completamente tudo o que havia planejado: “Não sei explicar o que aconteceu, só sei que, ao ver aquelas duas senhoras, de mais de 80 anos, entrando pelo tapete vermelho, uma amparando a outra, enquanto uma menininha de cinco anos brincava perto do altar, um filme com aquelas avós passou na minha cabeça. Abri a cerimônia dizendo que, certamente, quando a neta, Mariana, tinha a idade daquela garotinha que ali brincava, elas não imaginavam que um dia estariam no seu casamento como damas-de-honra… A partir dai, embarquei na emoção, abordei a história dos noivos e fiz o que tinha que fazer. Depois, fiquei sabendo: a minha emoção contagiou todos os convidados”.
O depoimento de Mariana na página do Facebook mais uma vez confirma: “Até hoje nossos convidados falam sobre você, sobre a sua sinceridade, sua irreverência e, principalmente, sobre o impacto que as suas palavras causaram em suas vidas”.
Desde então, Marilucia já celebrou mais de 30 casamentos e tem agendadas cerimônias, inclusive, de bodas (de ouro, prata…), para o primeiro semestre de 2017. O boca-a-boca sobre a forma como “toca corações” tem feito a clientela crescer. O prazer e a emoção de fazer parte de momentos tão especiais vem transformando em carreira o que começou como uma celebração em família.
Portanto, se o exercício do Direito de Família já havia ficado pra trás, há nove anos, quando ela teve um AVC – “ali, nos meus 46 anos, tocou um alarme: a profissão de advogada não seria para a vida toda” -, a atuação na Responsabilidade Civil ficou com os dias contados.
Mas afinal o que é preciso para ser uma celebrante de uniões? Qual a diferença entre a sua atuação e a de um juiz de paz? Por que tanta gente confunde a atividade com a de cerimonialista? Marilucia explica: “O cerimonialista cuida de toda a preparação do rito de celebração. Da escolha da música e das flores, ao protocolo da entrada dos noivos e padrinhos, passando pelo cardápio do buffet e pelo registro da festa em video e fotografia. O celebrante conduz o ritual que sela a união. Escolhe o que dizer aos noivos e o que contar deles aos convidados, de forma a envolver todos naquele momento único. Ele/ela pode ser um juiz de paz ou não, uma vez que o que professa não tem valor legal, é só simbólico”.
Simbólico-afetivo. E por isso demanda tanta empatia do celebrante, além da inspiração para expressar em palavras a felicidade do encontro; para tornar cada união única, já que especial todas são. É exatamente nesse território delicado dos afetos que Marilucia transita com desenvoltura e diz estar descobrindo sua verdadeira vocação. “Uma vocação – diz ela, meio brincando, meio a sério – que jamais poderia ter descoberto aos 25 anos, quando estava tentando entender e celebrar o cerne da minha própria existência”.
Para Marilucia, a conexão que estabelece com os protagonistas de uma união acontece pela emoção. E é esse elo que lhe possibilita celebrar, amorosa e generosamente, tanto a cerimônia que une dois idosos apaixonados, como a que festeja a ligação de um casal grávido com o filho a quem está prestes a dar à luz.
“Sinto uma alegria enorme, cada vez que celebro uma união”—diz.
Ela frisa o termo união, em vez de casamento, porque, na sua perspectiva, as pessoas se juntam para fazer várias coisas, não só para constituir matrimônio, ou renová-lo em aniversários de bodas. E Marilucia está aberta para celebrar qualquer tipo de união; das amizades duradouras, às sociedades em negócios, passando pela formação de times e, por que não?, de partidos politicos (!). Nesse último caso, desde que atendam a uma condição: serem genuínos. E isso ela define de uma forma muito simples:
“Ninguém pode viver só pra si, ou só em prol dos próprios interesses. Há sempre que se buscar o bem maior e essa é uma jornada incansável. E justamente por exigir tanto esforço, essa busca, quando verdadeira, precisa ser celebrada com toda a pompa e circunstância”.
Com todo o meu respeito e a minha admiração: Evoé, Marilucia!!!!!! :–0))
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