Tempo de empreender

 

A microempresária e jornalista Sônia Araripe se define como uma contadora de boas histórias. Foto: Ana Lúcia Araújo

A microempresária e jornalista Sônia Araripe se define como uma contadora de boas histórias. Fotos: Ana Lúcia Araújo

 

Quando ela ri, os olhos apertam. A fala é rápida. Ela é uma pessoa determinada a aproveitar o tempo que tem da melhor maneira possível. Pode ser bebericando uma água de coco sentada numa confortável cadeira num quiosque na Lagoa Rodrigo de Freitas ou viajando pelo Brasil para encontrar histórias de transformação. E adora falar de empreendedorismo.

Aos 53 anos, Sônia Araripe faz projetos, compartilha seus conhecimentos em palestras, aulas e encontros com alunos e profissionais. Defende ainda uma alimentação saudável, mas sem radicalismo. Ela tem certeza que escolheu o melhor caminho, quando há dez anos deixou a redação de um jornal tradicional para abrir seu próprio negócio: Plurale, em revista e site, uma mídia independente. A microempresária e jornalista se define como uma contadora de boas histórias com temas ligados ao meio ambiente, social, sustentabilidade e casos de empresas nestas áreas. O caminho para empreender, segundo ela, depende de determinação.

“Não é fácil. É preciso saber realmente o que se quer fazer. Eu comecei há dez anos num período em que o cenário estava mais favorável, tive pessoas que acreditaram em mim, que investiram em mim. E eu acompanho tudo de perto desde a produção até a edição. Vou na gráfica. Supervisiono tudo. Eu não tiro férias (de 30 dias corridos) há dez anos. Tiro mini férias. Não é fácil, mas é prazeroso. ”

Engana quem pensa que ela só se concentra no trabalho. Noveleira assumida, não é raro ver suas opiniões sobre a nova novela nas redes sociais. Adora Carnaval e não perde um desfile. Foge de doces e mantém a forma com ginástica e caminhadas. Fala de trabalho, mas arranja um tempinho para fazer as unhas e “ajeitar o cabelo”. Inquieta, essa ariana ascendente em Áries assume que não é zen. E gosta de arriscar, mudar. No dia da entrevista, estava com cabelos na altura dos ombros. Dias depois nos encontramos e ela cortara os cabelos bem mais curto. Eu também. Rimos da coincidência.

Discreta quando o assunto é família, essa filha de um piloto da Aeronáutica reformado e de uma professora pública é casada há 27 anos com um engenheiro de telecomunicações, Newton Meyohas, e tem três filhos: Isabela, de 25 anos; João, de 22,e Felipe, de 16. Os três já foram fisgados pelo jornalismo.

Ao trilhar o caminho do empreendedorismo, ela colheu muitos frutos. No ano passado, em 6 de dezembro, recebeu a medalha Pedro Ernesto. Foi também escolhida, por votação realizada entre jornalistas pela Maxpress e Jornalistas & Cia, como uma das 100 mais Admiradas Jornalistas do Brasil em 2014. Formada em Jornalismo pela UFRJ (1984), tem pós-gradução pela PUC-Minas em Comunicação Empresarial e pela FGV-Rio em Meio Ambiente.

Durante sua carreira, passou por redações como a do Jornal do Brasil, onde ocupou o cargo de editora-executiva; Jornal do Commércio, TV Globo, O Dia, O Estado de S. Paulo (sucursal do Rio), Revista Forbes Brasil e também foi assessora de imprensa da presidência da Confederação Nacional das Seguradoras e da Vale.

Sônia está sempre em movimento.

Foto: Ana Lúcia Araújo

 

FAMÍLIA- “Família, uma coisa muito forte. Minha avó era uma mulher moderna, que ia ao cassino, jogava pôquer, cartas, lia livros em francês e era uma presença forte na casa. Acho que isso me influenciou muito no caminho para os  livros, a cultura. Me fez gostar de poesia. Minha mãe também era muito forte, uma guerreira, criando os filhos, trabalhando.”

MULHER AOS 50 ANOS- “Eu acho que hoje a mulher está super jovem. Adoro ver as fotos dessa geração e vejo mulheres jovens não só na aparência, mas no posicionamento. A mulher continua trabalhando, encarando o mundo. Se posicionando. Ela viaja, trabalha e é diferente. Eu não tive crises dos 30, dos 40 e para mim foi muito natural chegar aos 50. Na verdade, quando eu criei a Plurale estava no pós 40. Foi uma época que coincidiu com a mudança que eu queria fazer. Eu sempre fui muito corajosa nas decisões de trabalho. Eu acreditava que aos 43 eu conseguiria sair da redação e fazer uma coisa diferente. Então eu fiz. Não fiquei com essa neura de fazer 50. Eu acho que sempre tive coragem de fazer mudanças. O JB foi o melhor lugar onde trabalhei em redação. Mesmo assim, eu acreditava na mudança e voltei para assessoria. Terminava ali um ciclo.”

SURPRESAS – “As coisas vão surgindo e eu vou entrando. Não é fácil. Talvez neste aspecto a mulher seja muito mais cobrada, seja da família, dos filhos. Eu, por exemplo, tenho um marido companheiro há três décadas, três filhos que não seguiram a carreira do pai e que me acompanhavam desde cedo e viram a rotina do trabalho de um jornalista. É uma rotina pesada.”

PERSEVERAR- “Sou microempresária e não é fácil empreender no Brasil. Ao mesmo tempo que a mulher tem uma característica muito forte, porque tem que vencer, ela se cobra muito. Eu dei sorte porque já existiam boas mídias nessa área e era uma época em que a economia estava melhor, as empresas acreditaram na proposta. Sem rede você não faz nada. O que me move é contar histórias, ajudar a construir pontes, conhecer histórias de transformações e compartilhar isso. Eu compartilho o que aprendi. Faço palestras, coach.”

EMPREENDEDORISMO – “Não basta ter uma tremenda ideia e não botar para funcionar. O site conta histórias de transformação e sustentabilidade. Venho da área de economia. Não vou ensinar a botar o ovo em pé, mas é uma luta. As pessoas já conheciam meu trabalho no jornalismo e então apoiaram a iniciativa quando resolvi sair de redação e empreender. Meu único ativo na época era meu nome. O que o jornalista tem de valor é o seu nome, para o  bem e para o mal. Se você conseguir fazer uma carreira estável, se passar credibilidade, já está no caminho.”

Foto: Ana Lúcia Araújo

TRANSFORMAÇÕES- “Eu sou otimista. Se você olha para trás, é um Brasil. Se olha para frente, é bom poder contar essa história de transformação. A Amazônia é um lugar emblemático, muito forte, que provoca emoções, me comove muito. Às vezes a gente chega num lugar onde tem uma comunidade que fica muito distante do centro e temos pouco tempo para conversar e achar histórias. Eu me considero uma pescadora, vou jogando a rede e procurando pessoas que possam contar isso.”

SUSTENTABILIDADE – “Adoro a temática da Economia, mas me encontrei na sustentabilidade. Que é feminina, acima de tudo! Mais uma vez, não é tratar o assunto reduzido à questão do sexismo, mas de pontuar como tem uma papel forte de mulheres na sustentabilidade. Ligado ao cuidar, ao acolher, a ter propósito…. novamente, não estou falando que homens não tenham e não pratiquem a sustentabilidade. Mas tenho visto muitas mulheres reescrevendo suas histórias pelo empoderamento e pela prática da sustentabilidade. Plurale, ao longo de dez anos, tem contado muitas destas histórias.”

Foto: Ana Lúcia Araújo

JORNALISMO- “Na minha família, a pessoa mais próxima que eu conhecia como jornalista era meu padrinho, que trabalhava no JB – José Reis, nos anos 1970. Eu via ele trabalhando naquela máquina de datilografia e achava incrível. O primeiro presente que eu pedi foi uma máquina. Então, meus filhos tiveram uma referência e partiram para ao jornalismo (risos).”

CHEFAS MULHERES – “Meus primeiros editores em jornal foram homens. Grandes editores – Ricardo Bueno e Luiz César Faro,no Jornal do Commércio. Mas quando fui para o Jornal do Brasil já peguei a Miriam Leitão. Imagina o desafio! Já era a melhor jornalista da época em Economia. Desafio tremendo. Dei sorte de pegar também outras tantas editoras mulheres. Não é questão de sexismo. É a história como ela foi, contada tal e qual. As mulheres estavam assumindo lugares de chefia nas redações nos anos 80, justamente quando eu estava começando. Especialmente na Economia. Além da Miriam, também trabalhei com Cristina Calmon; Ruth de Aquino na Chefia de Redação e Cláudia Reis como editora-executiva em O Dia; Suely Caldas na sucursal carioca de O Estado de São Paulo; Cristina Konder em outra época no JB, como editora- executiva,e por aí vai. Foram referências muito importantes na minha formação. Claro, também tive grandes chefes homens, como Ricardo Boechat, Augusto Nunes, José Casado e Coriolano Gatto. Mas as mulheres – fortes e relevantes – foram importantíssimas na minha carreira! ”

MARMITA- “Eu acordo muito cedo, umas 5 da manhã. Meu marido sai cedo para o trabalho. Aqui em casa todo mundo é marmiteiro. Apronto a marmita cedo. Na minha, só tem coisa saudável, como frutas, legumes, um pedaço de proteína. Doce, eu adoro doce, mas não posso. Não sou muito de chocolate e cortei pão há mais de um ano. Cortei e achei que melhorou muito minha saúde.”

CARNE VERMELHA- “Não como carne vermelha há dez anos. Foi uma opção, a digestão era pesada, fazia mal. Adoro peixe, comida japonesa. Não sou vegetariana, mas mudei a alimentação. Meus filhos são carnívoros (risos).”

EXERCÍCIO. “Faço ginástica, musculação, caminhada. Não curto yoga, não sou zen. Sou agitada. Adora dançar samba, passear, viajar, namorar meu marido (risos).”

VAIDADE- “Gosto de brinco, de colar. Sou mais básica. Claro que gosto de fazer unha, ajeitar o cabelo. Fiquei loura depois de velha (risos), mas esse negócio de cabelo branco não gosto. Não é comigo não. Não desapeguei da tinta.”

Foto: Ana Lúcia Araújo

FOGO- “Sou Áries ascendente em Áries. Um signo muito forte. Não tenho sangue de barata. Acho que estou bem mais calma agora. Mas sou empreendedora, abro caminhos, vou encarando os desafios”.

SAMBA- “A gente adora. Torcia pela Mangueira, mas quando fui morar na Ilha do Governador passei a frequentar a quadra da Ilha. Todos os anos vamos ao Sambódromo. A família do meu marido era da Estácio, então temos o samba na veia.”

MEDO – “Eu amo o Rio, mas claro que tenho consciência que algumas coisas mudaram. Eu tenho medo de sair muito tarde e passar por lugares com tiroteio. E sabe como é, quem tem filho não dorme enquanto eles não chegam.”

CONSUMO – “Essa coisa de entender e controlar o consumo a gente tenta passar para os filhos. Precisamos dar valor a coisas que são realmente importantes. Na minha infância, a gente ia para o Aterro (do Flamengo) tomar sorvete, era um momento feliz. A Disney, por exemplo nunca foi meu sonho de consumo. Conheci com mais de 30 anos por causa das crianças. Mas aos 18 eu fiz um mochilão para a Inglaterra e foi uma experiência sensacional.”

PRAZERES – “Viajar, cozinhar, quero escrever livros, dar aula. Eu gosto de compartilhar. Sou muito determinada. Por exemplo, se eu digo que não vou comer carne, eu não como. Estou caminhando para não precisar, mas nada muito radical. Vou em busca do que faz bem para minha saúde. Eu acorde cedo e durmo cedo, adoro televisão, leio muito, encontrar amigos..”

LIVROS – “Comecei um projeto sobre meu pai e sua trajetória. Ele tem 88 anos, é de Vila Isabel e viveu muita coisa: desbravou o Pantanal, passou pela Amazônia, viu e viveu momentos importantes no Brasil. Estou construindo esse projeto. Tenho outros também na minha cabeça sobre jornalismo, por exemplo. Aos poucos eu vou realizando.”

 

Angelina Nunes

Angelina Nunes

Carioca, apaixonada pelo samba, ela tem pressa. Nasceu dentro de um trem da Central do Brasil, quando os pais tentavam chegar ao hospital na Tijuca. Está entre as jornalistas mais premiadas do Brasil, tendo conquistado Esso, Embratel, Vladimir Herzog, SIP, YPIS e Rey de España. Formada pela UFRJ, fez pós-graduação em Políticas Públicas no Iuperj e é mestre em Comunicação pela Uerj. Começou a trabalhar em 1980. Foi repórter e editora-assistente na Rádio MEC, TVE, TV Manchete, O Dia e O Globo. É professora na ESPM-RJ e integra o conselho da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), da qual foi presidente em 2008–2009. Adora viajar e inventar novas trilhas com a filha Bárbara e o parceiro Paulo. Gosta de dançar e cantar, de caminhar na praia ou no mato, de astrologia e tarot. Viciada em séries e em livros. Gosta de trabalhar em equipe e de fotografar. Não gosta de cozinhar, mas adora comer.

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